Jornalista, escritor e cronista toma posse na cadeira 11 da ABL nesta sexta-feira (18), às 21h, no Rio de Janeiro18/10/2019 857
Das salas de aula do antigo “Externato São José” e do então IEBA (Instituto de Educação Bento de Abreu, atual EEBA) saiu um menino curioso, criativo e questionador, que mudou-se para São Paulo aos 21 anos e conquistou o mundo. Esse menino é Ignácio de Loyola Brandão, que nesta sexta-feira (18), aos 83 anos, entra para a história e toma posse na Academia Brasileira de Letras (ABL). A solenidade de posse será às 21h, no Petit Trianon, sede da ABL, no Rio de Janeiro.
Loyola Brandão passa a ser o primeiro araraquarense a ocupar uma cadeira na ABL — a cadeira 11, que era do escritor, sociólogo, cientista político e advogado Hélio Jaguaribe, falecido em setembro de 2018.
Para o prefeito Edinho, Araraquara está em festa e muito lisonjeada pela posse de Loyola Brandão na ABL. “O gosto pela escrita levou Ignácio primeiro ao jornalismo, nas redações dos jornais de Araraquara. Depois partiu para os romances, contos e crônicas, sem nunca esquecer de suas origens e das peculiaridades da Morada do Sol, sua terra. Uma trajetória brilhante, sempre circulando entre o universo jornalístico e o literário. A posse de Ignácio de Loyola Brandão na Academia Brasileira de Letras orgulha toda a cidade de Araraquara”, afirma Edinho.
HISTÓRIA
O escritor nasceu em Araraquara em 1936, filho de Antônio Maria Brandão e Maria do Rosário Lopes Brandão. Jornalista, romancista e escritor, Ignácio passou pelas redações do jornal “Última Hora” e das revistas “Cláudia”, “Realidade”, “Setenta”, “Planeta”, “Ciência e Vida”, “Lui” e “Vogue”.
Ele iniciou sua carreira jornalística em Araraquara como crítico de cinema, aos 16 anos, no semanário “Folha Ferroviária”, passando em seguida para o diário “O Imparcial”, onde ficou por cinco anos. Há mais de duas décadas, o araraquarense é cronista do jornal “O Estado de S.Paulo”.
O escritor tem mais de 40 livros publicados. São romances, contos, crônicas, relatos de viagens e livros destinados ao público infantil. Entre os romances mais conhecidos estão “Bebel que a Cidade Comeu”, “Zero”, “Não Verás País Nenhum”, “O Beijo Não Vem da Boca”, “Dentes ao Sol”, “O Anjo do Adeus” e “O Anônimo Célebre”.
Seus livros foram traduzidos para diversos idiomas, incluindo húngaro, tcheco e sul-coreano. Com “O Menino que Vendia Palavras”, Loyola Brandão ganhou o Prêmio Jabuti de Melhor Livro de Ficção de 2008. Em 2016, recebeu da Academia Brasileira de Letras (ABL) o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto de sua obra. A mesma ABL que agora o acolhe como um novo imortal.
E toda essa história começou em Araraquara. Em entrevista para a Secretaria de Comunicação da Prefeitura, publicada em março de 2018, Ignácio de Loyola Brandão revelou que o convívio com seu pai o levou à literatura.
“Meu pai era operário de uma ferrovia. Economizando nos cigarros e na cerveja dominical, meu pai comprava quatro livros por ano, mandados buscar na capital. Na cidade não tinha livrarias. Os maquinistas ou chefes do trem traziam. Eu via meu pai lendo, concentrado. Católico, era ele que na igreja da paróquia fazia as falas em dias festivos, uma vez que os padres da congregação do Verbo Divino, vindos da Holanda, falavam um português horroroso, ninguém entendia nada. Via meu pai preparando os textos, falando, sendo aplaudido e comentado pelo que tinha dito. Isso me impressionava. Escrever, falar e ser aplaudido, reconhecido, respeitado. Foi a primeira visão que tive do oficio de escrever. Sei, vai nisso uma certa vaidade. Qual de nós não é?”, perguntou Loyola Brandão.
O escritor também comentou peculiaridades de seus tempos de aluno e agradeceu a duas professoras que foram fundamentais nessa trajetória: Lourdes Prada (que fundou o “Externato São José”, na esquina da Rua 8 com a atual Avenida Djalma Dutra) e Ruth Segnini.
“Devo minha carreira a Lourdes Prada e a Ruth Segnini, professoras que me ensinaram as primeiras letras. Mestras por instinto e paixão. Além de vários outros do ginásio e científico”, escreveu o agora imortal da ABL.
Loyola relatou que Lourdes não apenas alfabetizava os alunos, mas estimulava a reflexão e, de certa forma, a inquietação com os problemas do mundo. “Eu tinha 9 anos. A professora Lourdes tinha dado o tema da redação. ‘Vão escrever sobre o bairro em que moramos. Não quero historinhas bobas de cachorro na rua, briga de moleques, de quem namora quem. Contem um problema. Falem do que está escondido, do que as pessoas têm vergonha, medo. Desocultem’”, disse Loyola.
Outra história contada deixa claro o aluno questionador que foi Loyola, ao perguntar a Ruth Segnini quem era o pai de Deus. O questionamento virou tema de redação. O aluno escreveu somente quatro linhas, mas ganhou nota 100.
“Anos depois, Ruth me contou que escrevi algo assim: ‘Um dia Deus quis saber quem era o pai dele, porque todo mundo tinha pai e mãe e ele não. Então saiu criando o mundo e procurando o pai. Ainda hoje procura. Parece que o pai de Deus desapareceu’. Fui um teólogo precoce! Naquele momento, Ruth me deu outra aula: ‘Nunca tenha medo. Escreva o que vem à cabeça e acha certo. Arrisque. O estranho e incompreensível, o inexplicável hoje, amanhã se esclarece. Ou não, ou nunca. Mas isso já é assunto’”, contou Loyola.
Pois nesta sexta-feira, Ignácio de Loyola Brandão, aquele menino criativo e curioso, entra para a história da literatura brasileira.