Fotos e Matéria: Benedito Reginaldo Viviani.
A partida final naquele dezembro de 1983, no templo do futebol amador, o Estádio Municipal Tenente Siqueira Campos, da Rua Humaytá , entre União Skina e Dema foi disputada sob um dilúvio. O placar de 4 a 2 para os skinenses não deixou dúvida da superioridade dos “diabinhos da vila”, batizados assim pelo jornalista esportivo e policial Dirceu Zampieri, ao se referir em suas matérias as camisas e meias vermelhas do fardamento do União Skina.
O técnico Sérgio Onofre orientou os campeões de 1983: Vadão, Rogério Enxides, Flávio, Dinho, Luiz, Toninho Capeta, Moreno, Sarrinha, Ligeirinho, Ronaldo, Galinha, Rogério Onofre, Ziza e Nivaldo. Marcaram os quatro gols do título: Nivaldo (2), Ligeirinho e Heitor (contra). Para o Dema: Queijinho e Celso.
Já a conquista da sede de 14 mil metros quadrados na Vila Xavier teve vários embates na Câmara Municipal e a vitória foi graças à prerrogativa do decurso de prazo, uma norma jurídica a favor do Executivo para aprovações de decretos quando os vereadores não conseguiam definir a votação. No púlpito da Câmara, o defensor do Skina foi o então vereador Rubens Bellardi Ferreira.
Entre os diretores que brigaram irmanados com o Bellardi estavam: Celso Paschoal Onofre (Macauva), Salvador Onofre, Ivo Luiz Paduani, Antônio Marques, Silas Munhoz, Felipe Marques, Benedito Reginaldo Viviani, Jadier Zucco, Wlandevir Rodrigues, Aldo Ribeiro, Jair Ribeiro, Roque Fragalá, e José Carlos Figueira.
Atualmente, a área que abrigou o União Skina foi desmembrada e cedida para a Associação Cultural Afrodescendente dos Amigos de Araraquara e Região (ACAAAR), Instituto Conviva Down, Movimento Católico, Rádio Brasil FM, Projeto Anna Laura da Apae e Centro de Treinamento José Ricardo de Freitas.
Neste aniversário, o clube cinquentão segue ativo graças à abnegação do servidor público estadual aposentado Edmilson Palason, o Mil, de 59 anos de idade, que mantém em atividades as categorias de base, na faixa etária de 10 a 16 anos.
Mil tem apoio da rede de farmácias Droga Ven, que cede o material esportivo; do Beto, da Academia Personal, que colabora na manutenção física dos jovens atletas e da diretoria da ACAAAR, onde o Skina treina ações táticas e se prepara fisicamente.
“Meu desejo é continuar com a garotada, mesmo com todas as dificuldades que encontramos com a crise mundial”, afirmou o técnico skinense. Mil está no clube desde os anos 1980.
Fundação
A esquina da Avenida Carlos Batista Magalhães com a Rua Bento de Barros, a antiga Rua do Tesouro, na Vila Xavier, era o ponto da resenha da garotada, entre 15, 16 e 17 anos, após os rachões no “mangueirão”, um terreno no começo da Avenida Vinte e Dois de Agosto, hoje estacionamento do restaurante Bom Prato.
Os bons de bola eram convidados pelo técnico Murtão para jogarem no Universal Futebol Clube. E os outros ficavam frustrados em não poder calçar as primeiras chuteiras.
Em 1970, O assunto nas resenhas dos garotos era o início de mais uma Copa do Mundo. E foi nesse clima que decidiram fundar um time de futebol, de campo grande, e deixar para trás o pequeno mangueirão e o futebol de caixão na rua.
Primeira providência: escolher o nome do time. Turma da esquina virou União Skina EC. Segunda providência: a compra das camisas. A ideia foi imediata: elaborar uma rifa. Um LP dos Beatles pelo sorteio da Loteria Federal. Cem dezenas. Cada um ficou incumbido de vender 10 números.
Terceira providência: eleger um presidente maior de idade. Marcos Cumpri sugeriu o nome do ferroviário Odilon Ferreira. Total aprovação. Odilon ficou sabendo que era presidente no dia seguinte, ao colaborar com a rifa.
As primeiras camisas foram compradas na “cidade”, subir pra Vila ou descer pra cidade era gíria comum à época, na extinta Loja do Brondino, na Avenida São Paulo, ao lado da farmácia do “seo” Herculano Raia. O material esportivo estava em liquidação.
Camisas branquinhas com uma lista diagonal vermelha, sem número. “Lembrava a seleção do Peru, do craque Cubillas da Copa de 70”, recorda Tetê Viviani, um dos fundadores do Skina.
Entusiasmados com a conquista do tricampeonato no México, pela seleção brasileira de Pelé, Gérson, Jairzinho Tostão, Rivelino, os meninos do Skina enfrentaram o experiente Olaria, da Estação Ferroviária, no jogo de estreia, e perderam por 4 a 0, num domingo de julho. Faltou fôlego para correr no campo grande da Atlética, justificaram na resenha.
Outra decepção na terça-feira foi o recolhimento das camisas, cada um era responsável em pedir para a mãe lavar sua camisa após o jogo. Todas manchadas. O vermelho da faixa diagonal desbotou. O barato saiu caro.
Atlética, a casa do Skina
Um pacto dos garotos do Skina com o então presidente da Associação Atlética Ferroviária, Alencarliense Rodrigues, garantiu o uso do Estádio Carlos Pereira, depois denominado Adail Pavanelli, uma vez por semana, de preferência aos domingos, às 9h, ou à tarde, às 16h.
Em contrapartida, o Skina garantiu 20 novos associados ao quadro social do clube da Estrada de Ferro.
Deu certo. O Skina ganhava experiência, os adversários pagavam a outra metade do aluguel para a Atlética e surgiram os primeiro torcedores skinenses oriundos da Colônia Paulista, um núcleo residencial para os ferroviários na frente do estádio.
Gestão
Em 1973, o clube disputou o primeiro campeonato varzeano, fez uma boa campanha, inclusive venceu o campeão Quintandinha FC, por 2 a 1, na preliminar de Ferroviária x América, na Fonte Luminosa.
A diretoria sentiu que o clube vinha em ascensão e tratou de legalizar o clube visando as competições oficiais.
Em quatro anos de existência, o Skina se filiou à Liga Araraquarense de Futebol (LAF), Liga Araraquarense de Futsal (LAFS) e Federação Paulista de Futebol (FPF).
O Skina sempre teve uma gestão compartilhada. Desde o presidente fundador Odilon Ferreira até os dias atuais com o comando de Edmilson Palason.
Também cuidaram com carinho do Skina os presidentes Mário Brito Zampieri, Manoel Melendes, Everaldo Soares, Salvador Onofre, Celso Paschoal Onofre, Luiz Carlos Lima e José Nascimento.
Revelações
Em cinco décadas, centenas de atletas defenderam o Skina nas categorias de base, nos campeonatos amadores, veteranos, torneios e copas na cidade e na região e até algumas participações em outros estados.
Nos anos 1970, o atacante Coquinho (1951-2016) se destacou com a camisa nove do União Skina, marcando gol incríveis e logo despertou interesse dos clubes amadores. Assinou o primeiro contrato profissional com a Ferroviária, depois passou por São Paulo FC, América MG, Vitória BA e Comercial MS.
Tatinho, Tonho Palhares, Tonhezinho e Mimi foram outros profissionais que jogaram partidas amistosas pelo Skina nos anos 1970.
Já na década de 1980, o Skina foi campeão do Campeonato Juvenil “Wilson Silveira Luiz” de 1982, da Liga Araraquarense de Futebol, sob o comando do descobridor de talentos Washington Luís Silva, o Tota, ao vencer a Ferroviária na decisão de pênaltis. O tempo normal de jogo e a prorrogação da final apontou empate, por 0 a 0.
Os comandados de Tota também venceram a Ferroviária na fase de classificação por 2 a 1. Levantaram o troféu para o Skina: Éder; Edson, Careca, Becão e Trim Trim; Ju, Eloy e Nelsinho; Roberto, Toninho e Marquinhos.
A Ferroviária, do técnico Carlinho Fagnani, foi vice-campeã com: Douglas; Célio, Bazinho, Rosa e Edinho; Antônio Carlos, James e Nenê Clemente; Lúcio (Jaime), Carlinhos e Robertinho (Carlos Alberto).
O ex-lateral esquerdo Rogério Seves (Ferroviária e Santos FC) começou no futsal do Skina.
Nos anos 1990, o técnico Edmilson Palason começava a carreira no União Skina, após defender o clube como atleta de futebol e atletismo.
Entre 1996 e 1997, Mil orientou o garoto Leandro Donizete, de Santa Lúcia, que já mostrava garra na marcação e ousadia para atacar. Leandrinho disputou campeonatos municipais e regionais pelo União Skina. Depois, brilhou na Ferroviária, Coritiba, Atlético Mineiro, Santos e América Mineiro.
Em 2000, o Skina sagrou-se campeão mirim com os gols marcados pelo atacante José Tadeu Mouro Júnior. Tadeu, atualmente com 34 anos, está no Pelotas (RS). Em sua carreira defendeu Cruzeiro, São Paulo FC, Palmeiras, Grêmio (RS), Juventude (RS), Bursaspor da Turquia, entre outros.
A disciplina do esporte proporcionada por Tota e Mil fortaleceu a carreira de milhares jovens na vida profissional em vários segmentos da sociedade.
Eventos sociais
A diretoria promovia brincadeiras dançantes, bailes, carnavais, festas juninas, bingos e sessões de cinemas para adultos para compra de material esportivo, despesas de arbitragens, confraternização e até para “contratar” atletas dos rivais.
As brincadeiras dançantes, bailes e eventos eram realizados em parceria com clubes e entidades que tinham salões sociais. O Skina entrava com o equipamento de som e rachava a bilheteria, o outro parceiro ficava com o bar.
“O Chico Som, da Vila Velosa, era o nosso DJ da época e ele tocava a noite inteira com discos de vinil. Das baladas românticas internacionais para os casais dançarem de rostos coladinhos, ao agitado rock da norte-americana Suzi Quatro e também tinha sambão de Benito de Paula, Martinho da Vila e Agepê”, recorda Tetê Viviani.
Os convites, gratuitos, para as mulheres eram distribuídos durante a semana e os cartazes eram colocados em pontos estratégicos da cidade.
“Uma foto do Chico com fone de ouvido em cima de uma carroça, no gramado da Estância Uirapuru ilustrava o cartaz. A data e o local do baile eram preenchidos à mão”, acrescenta Tetê Viviani.
A turma do Skina realizou eventos, primeiramente, no salão da Atlética, depois no salão do Canil da Vila; no Estrela FC, na Vila Velosa; com o Santana FC, que o salão era no São Geraldo; na Boate Gramophone, na Avenida Brasil; na Nipo Brasileira, na Avenida Bonifácio e uma temporada no Internacional, de Santa Lúcia, inclusive com carnaval corintiano em 1978.
Tardes de domingo nas estradas
Desde os primeiros anos de existência, o União Skina manteve a tradição de jogar aos domingos nas fazendas e cidades da região, alias o mesmo ainda ocorre com os garotos do Mil em disputas de copinhas e torneios regionais. No final do ano passado, o juvenil do Skina atuou em Nova Europa na inauguração do estádio do Centro de Lazer do Trabalhador.
Nos anos 1970 e 1980, A banca de calçados da família Leandro no Mercado Municipal era o ponto de encontro dos diretores de clubes da região para marcarem jogo e combinar as garantias (recursos para as despesas de transporte). Os jogos eram divulgados, antes e depois, nos programas esportivos da Rádio Cultura e da Morada do Sol e nos espaços generosos dos jornais O Diário e O Imparcial.
Portanto, o Skina era um time que os clubes da região gostavam de enfrentar pela visibilidade na mídia.
Nos setores da Usina Tamoyo o “diabinhos da vila” se apesentaram várias vezes na Marisa, Bela Vista, Barreiros, Marilu e, lógico, no Estádio Comendador Freitas. Também nas usinas Maringá, Santa Cruz, Zanin, da Serra (Ibaté), Fazenda Itaquerê de Nova Europa, Fazenda Alpes, Fazenda Periquito e Fazenda do Lazinho.
Mais adversários tradicionais aos domingos: Internacional (Santa Lúcia), Americano (Américo Brasiliense), Paulista (Rincão), Guatapará FC, Motuca FC, Juventus (Guariba), Botafogo (Monte Alto), Bocaina FC, Ribeirão Bonito FC, Gavião Peixoto FC, Boa Esperança do Sul e Trabiju.
Patrimônio
Inúmeras reuniões informais do União Skina foram realizadas no bar do Chico Português, na Tapeçaria do Macaúva e no bar do Torquato, na Vila Xavier. O desejo de ter uma sede própria sempre esteve em pauta.
Nos anos 1980, em parceria com o comerciante Jorge Macris, o Skina teve uma sede alugada na Rua Barão do Rio Branco, em frente ao Bar do Sinésio.
E numa reunião ordinária com o corretor Laudelino, o Lau, da Vila Popular, os diretores do Skina, com o aval de Macris, tio do deputado federal Vanderlei Macris, compraram oito mil metros quadrados na Chácara Flora.
O sonho daqueles meninos da esquina se transforma em realidade.
O tempo passou, o Skina participou do carnaval de 1982, na categoria bloco, as despesas com as esquipes juvenil e amadora aumentaram e os novos compromissos com área cedida em comodato pela Prefeitura, nos altos da Vila, foram fatores preponderantes para a venda da área na Flora, que estava quitada.
E no início dos anos 2010, também a área cedida pela Prefeitura foi transferida do Skina para a ACAAAR.
Portanto, o clube completa 50 anos sem bens patrimoniais, mas a chama da esperança continua acesa com os garotos do Mil, que ostentam no peito o emblema de uma esquina de pureza, fé e amor ao esporte.
Depoimentos
“Eu costumo brincar que fiz carreira e me aposentei no União Skina. Atuei no juvenil, nos anos 70, depois no amador, nos anos 80, brinquei nos veteranos nos anos 90 e fui presidente nos anos 2000. Portanto, sem dúvida os melhores momentos de boa parte da minha vida estão relacionados as alegrias proporcionadas pelo clube”, relatou o aposentado da CPFL, Luiz Carlos Lima, de 63 anos de idade, que ainda faz ‘exibições’ de futebol, em dois dias da semana, com amigos no campo dos Machados.
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“No ano em que a Ferroviária fez bonito na Taça de Ouro (Brasileirão), deu União Skina E.C. no Amadorzão de Araraquara. Tive a felicidade de ver a final – Skina 4 x 2 Dema -, no Estádio Municipal. A rádio Cultura transmitiu o jogo, na bela voz de Antônio Carlos Araújo. Fui o comentarista e enalteci os ‘Diabinhos da Vila’ pelo seu feito maior no futebol. A Vila Xavier ficava ainda mais alta, exultando por ter seu União Skina como campeão amador de Araraquara em 1983. O time de Salvador Onofre, Tetê, Macaúva e outros destacados esportistas honrou as tradições da grande palpitante ‘Vila’. 50 anos de muita história no esporte, completando-se em 1º de junho de 2020. Parabéns, União Skina E.C.”, recordou o escritor Vicente Henrique Baroffaldi, de 73 anos, ao saudar o clube pela data marcante.
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“A história do União Skina é interessante por ser um clube fundado por garotos sonhadores. A renda para a compra do material esportivo, das taxas de ligas e competições era obtida com criatividade em eventos sociais e com divulgação realizada corpo a corpo. O clube nunca teve um investidor de peso. Aliás, o maior peso sempre foi a camisa do clube e seu tradicional emblema, que tem o conceito de um pacto numa esquina. Cresceu, conquistou títulos, teve patrimônio, perdeu patrimônio e se mantém ativo da mesma maneira que começou”, retratou o repórter-fotográfico Benedito Reginaldo Viviani, o Tetê, de 65 anos, uns dos fundadores do clube.
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“Durante os mais de 60 anos na mídia esportiva, convivi, graças a Deus, com um ‘punhado’ de obras educativas. E dentre elas, guardo com carinho especial, as ações do estimado “cincoentão”, União Skina. O Skina não era, pura e simplesmente, um time de futebol. Era uma espécie de ONG que tinha como objetivo principal, preparar cidadãos através do futebol. São inúmeras as promoções que o chamado “Vilão” realizava em favor da preparação dos meninos da época. Alguns para o profissionalismo no futebol. Mas a grande maioria, jovens preparados para o enfrentamento e superação dos obstáculos da caminhada terrestre. Não dá pra contar quantos cidadãos foram preparados ali no Skina e que hoje fazem parte da comunidade ativa e bem intencionada da nossa cidade. Só me resta cumprimentar os skinenses pelos bem vividos 50 anos. Parabéns, e que Araraquara tenha o privilégio de contar em suas hostes, agremiações como o União Skina, um verdadeiro orgulho da nossa gente”, observou o jornalista Wilson Silveira Luiz, de 82 anos.
“Eu tenho saudades da época dos campeonatos de futebol e da luta por uma sede social e esportiva. Encontramos resistência na Câmara Municipal e conseguimos a vitória em 1982. Nós também montamos um bloco de carnaval, no mesmo ano, e fizemos uma homenagem à Companhia Trólebus Araraquara (CTA). As arquibancadas na Via Expressa estavam lotadas e o Skina foi aplaudido”, relembra o aposentado Wlandevir Rodrigues, o Iá, de 74 anos, ex-técnico de futebol e ex-diretor do clube.
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Foto 1 – Logo de 50 anos do União Esporte Clube de Araraquara/SP!
Foto 2 – Folder do União Skina E.C exposto na esxposição Futebol no Chão.Times da nossa Terra, no MRE Paschoal Gonçalves da Rocha!
Foto 3 – Bloco Carnavelesco União Skina no Carnaval Arrarquarense de 1982.